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Lamano e a Fisioterapeuta


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Anos 80.


Eu havia voltado do exílio e morava de novo em Ribeirão Preto.


Vez ou outra minhas práticas esportivas sempre contínuas me ocasionam algum tipo de lesão física e devido a um estiramento na panturrilha esquerda procurei tratamento em uma clínica de fisioterapia, localizada no bairro Alto da Boa Vista.


Na recepção uma simpática secretária me atendeu, conduzindo-me ao interior do prédio, onde me apresentou a uma profissional do ramo que ficaria encarregada do meu caso.


Após a segunda sessão na clínica, comecei a sentir uma leve recuperação no músculo ofendido, o que me fez prosseguir com o atendimento, ansioso que estava para voltar às pistas.


Praticante de corrida até os dias de hoje, sempre me entristece ter que suspender temporariamente o esporte, o que ocorreu naquela oportunidade, pois em uma competição exigi de meus músculos um pouco mais do que eles permitiam.


Animado com a melhora compareci à sessão seguinte e dirigindo-me à maca para o atendimento passei por um senhor que lá se tratava, sentindo um certo mal-estar com aquela presença.


Sorridente Fernanda me atendeu, perguntando por eventual melhora e explicando o tipo de trabalho que iria fazer em minha perna naquele dia.


Antes que começasse perguntei-lhe se ela sabia o nome da pessoa que me causara aquele inexplicável incômodo.


De imediato a moça respondeu que se tratava do Sr. Miguel, a quem ela também prestava atendimento profissional.


Senti um arrepio.


Os anos haviam se passado, mas minha intuição dizia que algum sentimento ruim emanava daquela pessoa e perguntei a Fernanda:


- Você sabe o sobrenome dele? Pareceu-me um conhecido da família que não vejo há muito tempo.


- Não sei, mas vou ver a ficha dele e te falo, respondeu-me a fisioterapeuta:


Ela saiu da sala e logo voltou com a informação:


- O nome dele é Miguel Lamano.

Por alguns segundos fiquei sem reação, mas em seguida me recompus e disse:


- Esse homem é um torturador! Há mais de 20 anos, em 1969, ele foi um dos agentes da ditadura militar em Ribeirão Preto que cometeram as piores violências contra os presos políticos, tais como pau-de-arara, choques elétricos, pancadas, afogamentos, torturas psicológicas e sexuais.


E prossegui:


- Na época Madre Maurina Borges, freira diretora do Lar Santana chegou a ser estuprada por esses bandidos em nossa cidade, o que fez com que Lamano e o delegado Renato Ribeiro Soares fossem excomungados pelo arcebispo de Ribeirão Preto.


Fernanda engoliu em seco e seus olhos cresceram, como se estivesse assistindo a um filme de terror.


Voltando ao momento que vivia, ela me disse com firmeza:


- “A partir de hoje eu me recuso a atender esse monstro.”


Leopoldo Paulino

 
 
 

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