O Rei dos Hunos x O Tribuno de Roma
- Leopoldo Paulino

- 17 de nov. de 2021
- 2 min de leitura

No mês de outubro de 1973 cheguei ao Panamá, retirado do Chile pelo governo daquele país depois de ser preso pelos esbirros de Pinochet e passar vinte dias na embaixada panamenha, juntamente com quase 300 refugiados políticos.
Beti, minha mulher na época, havia saído do Chile com nosso filho Tico, no primeiro voo que o governo panamenho providenciou e eu desembarquei no país caribenho no segundo voo, com dezenas de refugiados latino-americanos.
No Panamá os homens foram levados para a província de Los Santos e alojados nas cidades de Chitré e Guararé, essa última onde estive hospedado.
As mulheres e crianças já estavam na capital do país e fomos informados pelo governo panamenho que alguns dias depois iríamos ao encontro da família, o que realmente aconteceu.
Em Guararé ficamos em uma pensão e no quarto em que estive acomodou-se também o camarada Maninho, cujo nome era Ronaldo Dutra Machado, o “Amaral” da ALN.
Estavam ainda na habitação os companheiros Cícero Viana, da ALN e Valneri Antunes, o Átila, da VPR.
Finalmente, depois dos dias difíceis em virtude do golpe militar no Chile, dos dias confinados na embaixada do Panamá, que solidariamente nos acolheu e de um voo tenso, pudemos sair às ruas e desfrutar da hospitalidade do povo panamenho.
Certa noite Cícero esteve em um bar e se empolgou um pouco na cerveja, chegando à pensão um pouco tarde, onde eu e Átila já nos encontrávamos.
Um pouco alterado, Cícero começou a fazer brincadeiras com Átila, que atingiam sua honra de homem dos pampas.
Começou dizendo: “Gaúcho é tão macho, até debaixo de outro macho”!
Átila não gostou da brincadeira e manifestou sua contrariedade ao companheiro de quarto.
Em seguida, Cícero passou a cantar:
“De manhã bem cedo
Chimarrão bem quente
E uma pica grande
No cu da gente”!
O valoroso gaúcho se alterou e disse que se o “cantor” não parasse ele ria enchê-lo de porrada.
Fiz um apelo a Cícero para que ele deixasse de brincar, pois nosso camarada não estava gostando e além do mais, a situação poderia evoluir para um embate físico, o que causaria um mal-estar entre os refugiados e principalmente para nossos anfitriões.
Comecei a falar alto para tentar evitar o confronto, mas percebi que sozinho não teria condições físicas de segurar os contendores.
Nesse momento chega o companheiro Maninho e de imediato pedi seu apoio para evitar que algo pior acontecesse.
Indiferente a nossos apelos, Cícero continuava a cantoria:
“E de madrugada
Uma caralhada”.
Nesse momento o caldo entornou e Átila partiu para cima do inoportuno brincalhão, enquanto Maninho tentava agarrá-lo com firmeza.
Ao mesmo tempo me aproximei de Cícero elevando o tom de voz e conseguindo convencê-lo a sair do quarto comigo.
Andei um pouco com ele pelas proximidades da pensão e voltei depois que ele sossegou e concordou em se alojar provisoriamente em outro quarto.
No dia seguinte, no café da manhã, Cícero dirigiu-se a Átila e lhe pediu milhões de desculpas pelas brincadeiras que não haviam agradado.
Agradeceu a mim e a Maninho pela nossa intervenção e passamos todos a conversar sobre a situação política e como seria a nossa volta para o Brasil.







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